Por Delegado Bruno Zanotti
O questionamento gira em torno do alcance do seguinte dispositivo do CPP: Art. 6° Logo que tiver conhecimento da pratica da infragao penal, a autoridade policial devera: (…) IV – ouvir o ofendido:
Em nosso livro DELEGADO DE POLÍCIA: TEORIA E PRÁTICA (8a ed. lanqada em 05/2023 – EDITORA JUSPODIVM), defendemos “a obrigatoriedade de o Delegadode Polícia intimar o investigado para participar de tal oitiva, a qual somente poderia ser dispensada em casos excepcionais”.
Existem certas situações, por exemplo, quando o investigado está no estrangeiro, em lugar desconhecido, foragido ou mesmo em coma hospitalar, nas quais a sua intimação pode não acontecer.
PONTO 1: Essa dispensabilidade não é algo que está à disposição do Delegado de Polícia e sãocircunstâncias fáticas do caso concreto que determinarão a melhor forma de dar seguimento a investigação criminal, a qual pode ser concluída em situações excepcionalíssimas sem a intimação do investigado.
PONTO 2: A intimação do investigado não importa na sua EFETIVA participação. Como assim? De um lado, cabe ao Delegado promover a intimação do investigado; por outro lado, a negativa do investigado em ser interrogado após regular intimação consiste em exercício da sua vontade democrática (índole de matriz democrática).
PONTO 3: A finalidade de tal posicionamento é direcionar uma crítica para algumas jurisprudências teratológicas dos tribunais pátrios, tal como a decisão na próxima imagem do STJ que validou a desnecessidade da oitiva do indiciado durante o procedimento investigativo, bem como impossibilitou a sua eventual ativa participação na investigação criminal com o seu depoimento, com pedidos de diligências e com juntada de documentos.
Imagine que seia VOCÊ o(a) investigado(a): em tais casos. você poderia tomar conhecimento da investigação somente por ocasião da AÇÃO PENAL. Percebem como isso é teratológico? Mas outra e a posição do STJ:
STJ: “O inquérito policial e o procedimento investigatório efetuado pelo Ministério Público são meramente informativos, logo, não se submetem ao crivo do contraditório e não garantem aoindiciado exercício da ampla defesa. Desse modo, não se vislumbra nulidade pela ausência de oitiva do investigado na fase indiciária, sobretudo porque ele teve oportunidade de se defender de todas as acusações antes do recebimento da denúncia pelo Tribunal a quo, em virtude das prerrogativas de seu cargo de Promotor de Justiça” (HC 142089, julgado em 28/9/2010, ReL Ministra Laurita Vaz).
Sim, essa é uma prática que ja vi inúmeras vezes (eu mesmo ja assim procedi nos primeiros anos como Delegado de Polícia). Ainda hoje essa prática é REAL e o entendimento permeia julgados do STJ em cenários similares: “É firme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça que supostas nulidades existentes na fase inquisitorial não são aptas a tornar nula a ação penal. Ademais, “não é assegurado ao investigado o exercício do contraditório do âmbito de inquérito policial ou de procedimento investigatório instaurado pelo Ministério Público” (HC 380.698/SP, ReL Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 05/10/2017, DJe 27/10/2017), de modo que nao há cerceamento de defesa pela ausência de oitiva das testemunhas no âmbito do inquerito policial (HC n.518.388/SP, relatora Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 20/08/2019, DJe de 2/9/2019).
Prof. e Del. Bruno Zanotti – Doutor e Mestre em Direitos em garantias fundamentais. Professor de Direito Constitucional e Investigação Criminal. Prof. no Curso Ênfase e em pós-graduações. Autor de obras publicadas pela Editora Juspodivm. Delegado de Polícia da PC-ES. É Diretor da ADEPOL DO BRASIL