Artigo: Liberdade, lockdown, medidas restritivas e características de estado de sítio

JUS.COM.BR – Publicado em 03/2021

Considerando esse momento difícil pelo qual passa o mundo em razão da covid-19, não é raro alguns governantes imporem medidas restritivas, cada vez mais severas, como o confinamento (lockdown), toque de recolher, limitações de horários em que as pessoas não podem estar em via pública, dentre outras, que violam o direito fundamental à liberdade, todavia, não se pode olvidar que o direito à vida também é fundamental, conforme expresso no art. 5º, caput, CF, que garante a inviolabilidade do direito à vida e à liberdade, que são direitos fundamentais de primeira dimensão, ou seja, foram os primeiros a serem conquistados com bastante luta durante séculos a fim de limitar os abusos estatais e dar mais garantias aos indivíduos da sociedade.

No Brasil, o STF reconhece competência concorrente de estados, DF, municípios e União no combate à covid-19, em sessão realizada por videoconferência, o Plenário, por unanimidade, referendou medida cautelar deferida em março pelo relator Min. Marco Aurélio. Porém, na prática, os decretos federais, estaduais, distrital e municipais expedidos pelos chefes do respectivo Poder Executivo nem sempre contém as mesmas regras, ao contrário, há divergências constantes entre eles no enfrentamento da pandemia.

Existem, atualmente, municípios que adotaram medidas restritivas mais severas como toque de recolher, limitação de horário para que as pessoas não estejam em via pública, aumentando cada vez mais o tempo para que as pessoas permaneçam em suas casas, mas nem todos os brasileiros possuem casas, boa parte vive em barracos, favelas, e outra parte se encontra em situação de rua, ficando expostos e vulneráveis à violência urbana e a todo tipo de perigo e contágio, não apenas da covid-19.

A República Federativa do Brasil se configura em Estado Democrático de Direito porque todo poder emana do povo, bem como porque todos, sem exceção, devem respeito às normas jurídicas, obedecendo as liberdades e os diretos individuais e coletivos. Por outro lado, podem ocorrer imprevistos como crise administrativa, financeira ou institucional, até ameaça à integridade nacional.

Destarte, para combater tais imprevistos, a União e os estados podem utilizar medidas excepcionais e temporais como: a) intervenção Federal ou Estadual; b) Estado de Sitio e c) Estado de Defesa. Entretanto, antes de falar sobre a semelhança das características do Estado de Sítio e do confinamento “lockdown”, vale frisar que Estado de Sítio e Estado de Defesa são considerados estados de exceção porque totalmente contrários ao Estado Democrático de Direito, pois suspendem alguns direitos da população.

É neste ponto sobre a suspensão de alguns direitos que enxergamos, na prática, características semelhantes entre o Estado de Sítio e as medidas restritivas adotadas por alguns governantes sob a alegação de combater a covid-19, visto que em vários municípios do Brasil, as pessoas, além de não poderem sair de casa em determinados horários, também às empresas são impostas medidas que diminuem o seu tempo de funcionamento, o que acaba por minorar a importância jurídica da função social da empresa, trazendo sérias consequências para a sociedade como altas taxas de desemprego, perda do poder de compra, falência da economia, situação de miséria, depressão, suicídios, além de outras mazelas.

O art. 137, I, CF, dispõe que o Estado de Sítio pode ser decretado, dentre outras situações, em casos de comoção grave de repercussão nacional, neste sentido, a covid-19 já é considerada a principal tragédia global deste século, causando indubitavelmente grave comoção de repercussão internacional. Já o art. 139, CF, prevê que, na vigência do estado de sítio, poderão ser tomadas contra as pessoas as seguintes medidas: I – obrigação de permanência em localidade determinada; (…) IV – suspensão da liberdade de reunião. De fato, isso já vem ocorrendo na pandemia com a obrigação de permanecer em casa e a proibição de reunião, em especial, para celebração de cultos religiosos.

Ademais, sob alegação de garantir o direito à vida e tentar controlar a pandemia, muitas vezes acontecem graves excessos por parte dos governantes ao decretar medidas restritivas severas, chegando a serem comparadas em muitos casos com o Estado de Sítio no que diz respeito à suspensão de alguns direitos civis, como já foi dito.

Paulo César da Silva Melo
Paulo César da Silva Melo – Servidor Público Estadual desde 2000, Policial Civil desde 2002, Chefe de Cartório de Delegacias desde 2010, Bacharel em Direito pela UNEAL – Universidade Estadual de Alagoas, Escritor de artigos jurídicos, Pós Graduando em Direito Penal e Processual Penal aplicados, com cursos de especialização em segurança pública promovidos pelo Ministério da Justiça, estudioso das ciências criminais.

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