É direito do defensor do investigado ter acesso a todas as provas documentadas em procedimento investigatório, seja ele sigiloso ou não, conforme a Súmula Vinculante 14 do Supremo Tribunal Federal.
Com esse entendimento, a 7ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo autorizou a defesa de um investigado a ter acesso às provas já produzidas e documentadas em um inquérito policial que tramita sob segredo de justiça há mais de 30 dias.
A decisão não dá acesso a diligências em andamento, cuja concretização dependam do segredo de justiça, pois, segundo a turma julgadora, se houver publicidade, elas ficarão comprometidas em sua eficiência, eficácia e finalidade. A decisão foi unânime.
O investigado é um comerciante, que teve uma carga apreendida pela polícia, junto com todos os documentos da contabilidade da empresa, diante da suspeita de roubo de mercadoria. Em mandado se segurança impetrado junto ao TJ-SP, a defesa alegou que tem tentado, sem sucesso, ter acesso ao inquérito.
O pedido foi negado em primeiro grau sob o argumento de que a investigação tramita de forma sigilosa. Na ocasião, a magistrada informou que liberaria o acesso da defesa assim que a Polícia repassasse todas as informações sobre o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, o que não aconteceu até o momento.
Ao acolher em parte o recurso da defesa, o relator, desembargador Freitas Filho, disse que a publicidade dos atos processuais é mais que uma regra, é uma garantia importante para o cidadão, pois permite o controle por qualquer indivíduo. Tal regra, afirmou, está prevista na Constituição, em seu artigo 5º, dedicado às garantias individuais, e também tem previsão legal no Código de Processo Civil, nos artigos 155 e 444.
O magistrado também disse que o segredo de justiça tem por objetivo manter sob sigilo processos judiciais ou investigações policiais, que normalmente são públicos, por força de lei ou por decisão judicial. Ele ressaltou que o segredo de justiça é muito utilizado na fase investigatória do processo penal devido à necessidade de preservação de provas e com intuito de não prejudicar as apurações.
“O interesse público de que todas as medidas investigativas determinadas atinjam a sua finalidade precípua que é a apuração do crime em comento, sobrepõe-se ao interesse, primordialmente, particular, o que torna válido e, mais do que isso, legítimo aplicar a exceção, que é o sigilo processual, em detrimento da regra, que é quase absoluta, a de ampla publicidade”, explicou o desembargador.
No entanto, na hipótese dos autos, Filho observou que o segredo de justiça foi deferido há mais de 30 dias, em 4 de novembro de 2021, sendo que, até o momento, não houve um pedido de manutenção do sigilo por parte da Polícia. Assim, ele considerou que já se ultrapassou um prazo razoável para o sigilo da investigação.
“De duas uma: ou bem o delegado presta contas e justifica a necessidade de sigilo, ou, a magistrada cumpre o que determinou a permite acesso do advogado aos autos. O que não pode é um ato de constrição ser mantido sem que a pessoa investigada possa saber a razão. Entendo que que a defesa tenha o direito de acessar os elementos de prova já documentados no expediente investigativo, como sinaliza a Súmula Vinculante 14 do STF”, diz o acórdão, citando parecer da Procuradoria-Geral de Justiça a favor do acesso da defesa ao inquérito.
2275011-85.2021.8.26.0000
Conjur – 27/01/2022